terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Um homem alto conduzia quando se perdeu no horizonte em pensamentos. A chegada ao destino aconteceu num ápice; e sentiu-se insatisfeito. Era a viagem, o ir, o estar na estrada que maior prazer lhe trazia aos dias (que de monótonos) pesarosos.
Respirou fundo e parou.
Colocou o chapéu e entrelaçou os dedos na asa da mala. Respirou fundo e, ao olhar no espelho retrovisor, apertou a pele gasta; mas ao encontrar-se com a imagem dos seus olhos, largou-a com repúdio. Limpou a mão à lapela do casaco e, de seguida, esboçou o primeiro sorriso do dia.
O nojo profundo e repentino que sentiu de si carecia de escárnio para ser suportável.
Para o manter activo após a desilusão da chegada ao destino; sorriu.
Saiu do carro, trauteou o discurso seguro, caminhando até á campainha segura que denunciou a sua chegada.
"Amílcar Gomes. Os meus pêsames. O corpo? Onde está?"
As palavras não importam. Não têm peso nem intenção. É a forma como são pronunciadas que lhes dá o peso e o sentido.
Era a forma que ensaiava nas palavras que mastigava como se fossem a lista de supermercado.
Amílcar era pródigo em dotar as palavras da intenção certa.
"Não há angústia maior que a morte dos outros, nem alívio terreno maior que morrer."

1 comentário:

  1. Muito belo. E depois?
    Onde está o corpo?
    Vamos lá a combater essa preguiça!
    Beijinhos

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